Ricardo Amorim: "A pandemia e nossas escolhas"
UMA Pesquisa realizada pela Universidade Federal de Pelotas estimou que o verdadeiro número de pessoas infectadas pelo #coronavirus no Brasil é pouco mais de sete vezes maior do que o total de casos confirmados. Portanto, a letalidade real do vírus no país até aqui foi de 1/7 da letalidade medida, isto é 1%.
Então, 2,94 milhões de pessoas – 1,4% dos brasileiros – já teriam anticorpos e, em tese, estariam imunizadas. Especialistas estimam que entre 50% e 80% da população teriam de ter anticorpos para se atingir a imunidade de rebanho, quando a transmissão da doença é controlada pela própria dificuldade do vírus em encontrar novos indivíduos para infectar.
Mesmo considerando a estimativa inferior para imunidade de rebanho (50%), mais 102 milhões de brasileiros ainda teriam de ser infectados até isso acontecer. Infelizmente, isso significaria que, mantida a letalidade observada até aqui, ao menos mais um milhão de pessoas teriam de morrer de coronavírus no país até atingirmos a imunidade de rebanho.
Até que uma vacina ou tratamento completamente eficaz esteja disponível, as alternativas para limitar a transmissão são cuidados de higiene, testes, monitoramento e medidas de distanciamento físico.
O grande desafio é equilibrar a necessidade de salvar vidas com a necessidade de salvar empregos – e, por consequência, também vidas – e ainda preservar nossas liberdades individuais. Na prática, até que uma vacina esteja disponível, só há 3 alternativas, todas com custos ou riscos elevados:
1) Para proteger a economia e os empregos, relaxa-se o distanciamento, com risco real de termos mais de um milhão de mortos por coronavírus no país;
2) Para proteger a vida, reduzindo o número de mortos e mantendo nossa privacidade, mantemos algum grau de distanciamento social até uma vacina estar disponível em grande escala, o que não deve acontecer antes do ano que vem, causando um colapso da economia;
3) Para salvar vidas e a economia, abrimos mão de privacidade, permitindo que autoridades de saúde tenham acesso a nossos dados de celular e até gastos de cartão de crédito para monitorar infectados e pessoas que tiveram contato com eles, como fazem países asiáticos que tiveram mais sucesso em controlar a pandemia. O risco é que estes dados venham a ser usados para outros fins. Além disso, precisaríamos ser capazes de testar a população em massa, o que até agora não aconteceu.
Na prática, ao longo do tempo, acredito que teremos de optar por um misto das três opções, com concessões de cada um dos lados. Não tenho dúvidas de que, como sociedade, venceremos esta batalha. Mas para minimizar os elevadíssimos custos para saúde, economia e privacidade, precisamos de análises sérias, desapaixonadas, realistas e construtivas de todas as opções e os custos e riscos de cada uma dela.